Mas, como as ciências positivas não “podem” nem devem esperar pelo trabalho ontológico da filosofia, o progresso da pesquisa não se efetuará como “progresso”, mas como repeticão e depuração ontologicamente mais transparente do onticamente descoberto1.
Por mais fácil que possa ser a delimitação da problemática ontológica [52] diante da pesquisa ôntica, a elaboração e sobretudo a fixação do ponto-de-partida de uma analítica existenciária do Dasein não deixam de apresentar dificuldades. Em sua tarefa está contido um desideratum que de há muito inquieta’ a filosofia, mas em cuja obtenção ela sempre malogra de novo, a saber, a elaboração da ideia de um “conceito natural do mundo." A riqueza de conhecimentos sobre as mais diversas e longínquas culturas e formas do Dasein de que hoje dispomos parece tornar essa tarefa frutífera. Mas isso é somente uma aparência. No fundo, tal pletora de conhecimento leva ao não reconhecimento do próprio problema.. A comparação de tudo e a tipificação sincrética já não dão por si mesmas um autêntico conhecimento-de-essência. O domínio do multíplice
1 Recentemente, E. Cassirer fez do Dasein mítico o tema de uma interpretação filosófica; cf. Philosophie der symbolischen Formen [Filosofia das formas simbólicas], Segunda Parte: Das mytische Denken [O pensamento mítico], 1925. Essa investigação oferece fios condutores mais amplos à etnologia. Do ponto de vista da problemática filosófica, permanece de pé a questão sobre se os fundamentos da interpretação são suficientemente transparentes e, sobretudo, se a arquitetônica e o conteúdo matemático da Kritik d. r. V. [Crítica da razão pura] de Kant podem oferecer de algum modo o plano para semelhante tarefa e se não se requer aqui um ponto de partida novo e mais originário. O próprio Cassirer vê a possibilidade disso, como mostra a nota das pp. 16 ss, que remete a horizontes abertos pela fenomenologia de Husserl. Numa conversa que o autor pôde ter com Cassirer por ocasião de uma conferência sobre as “Tarefas e caminhos da investigação fenomenológica”, dada na sede da Kantgesellschaft de Hamburgo em dezembro de 1923, já se mostrou uma concordância a respeito da necessidade de uma analítica existenciária como a que tinha sido esboçada na conferência.
a De modo algum! Pois o conceito de mundo não foi sequer concebido.
165